Por Antonio Carlos Lima
Em capítulo dedicado a Gonçalves Dias, no livro que acaba de lançar, “Percursos da poesia brasileira”(Autêntica, 366 páginas), o poeta, ensaísta, professor da UFRj e crítico literário Antonio Carlos Secchin lamenta, em belíssimo e profundo ensaio, o fato de que, hoje, o poeta maranhense seja muito pouco lido.
Observa, com pesar, que a última edição de sua obra reunida foi a que Alexei Bueno organizou em 1998, vinte anos atrás. Considera incompreensível o lapso editorial em relação a quem classifica como “o primeiro grande poeta indiscutivelmente nacional”.
O fato é lamentável porque, no entendimento de Secchin, se a carta de Pero Vaz de Caminha representa nossa certidão de nascimento, como ficou estabelecido na historiografia, a “Canção do exílio”, de Gonçalves Dias, simboliza “a nossa carteira de identidade”.
No ensaio, o autor analisa o modo como o poeta caxiense reprocessou a questão da alteridade da cultura indígena em sua produção poética, ou seja, de que modo “observou e absorveu” as diferenças e refletiu o espírito nacional.
Conclui que, “ao esvair-se”, “o poeta se transforma num alterofilista, sem ‘h’: em vez de erguer alteres, cuida de levantar alteridades”.
Se o conjunto de textos do professor e crítico carioca se inicia com o estudo sobre o autor de “Os timbiras”, ele praticamente conclui o livro com dois escritos consagrados a outro maranhense, o poeta Ferreira Gullar.
Ao defender na Academia Sueca a concessão do Prêmio Nobel de Literatura ao autor do “Poema Sujo”, Secchin fez a exaltação de “uma vida admirável pela capacidade de dizer não a toda forma espúria de poder, mesmo ao preço de pagar por isso com a própria liberdade”.
Ele reconhece na obra de Gullar “uma poesia admirável pela inquietação e pela ampla gama de recursos, que tanto fere a nota pessoal do amor e da solidão quanto se ergue na defesa de valores éticos universais através de sua muralha luminosa de palavras”.
O outro texto transcrito é o que Secchin pronunciou na Academia Brasileira de Letras, onde ocupa a cadeira número 19, na recepção ao acadêmico eleito Ferreira Gullar.
O tratamento conferido a Gonçalves Dias e a Ferreira Gullar neste delicioso percurso que o professor Secchin nos convida a fazer pelos caminhos da nossa literatura, principalmente na fase de afirmação de nossa nacionalidade, faz justiça a dois grandes poetas brasileiros, um deles, talvez o maior deles, hoje esquecido.
E, sem que seja essa sua intenção, o livro reafirma a importância da contribuição maranhense na construção da cultura nacional.
Além dos dois poetas destacados, o livro menciona, de passagem, outros maranhenses: Sousândrade, Gentil Homem de Almeida Braga, Raimundo Corrêa, também esquecidos.
“Percursos da poesia brasileira” passa, naturalmente, ao largo de questões regionais. O objetivo do autor é oferecer ao leitor o que ele chama de “uma história informal” da poesia brasileira do período mencionado.
Nesse livro, Secchin revela-se apaixonado leitor de poesia.
Por isso, sua maior alegria, como professor, foi, como diz, perceber que pode auxiliar pessoas a superar resistências contra a poesia, “ou melhor ainda, perceber que, para uns poucos, a poesia passou a integrar também a cesta básica de alimentos indispensáveis à vida”.
O Maranhão, como se vê, contribuiu bastante para essa cesta com o pão espiritual de sua poesia.
Antonio Carlos Lima é Jornalista.
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