Por Wilson Sousa
O crime de desacato está descrito no artigo 331 do Código Penal Brasileiro; é praticado por particular contra a administração em geral. Desacatar significa menosprezar, menoscabar, desprezar e humilhar funcionário público no exercício de sua função ou em razão dela.
É exigido uma intenção especial por parte do autor em cometer o crime. Assim, em situações de extremo descontrole emocional ou ira, em que não existe no agente um ânimo refletido, no sentido de desrespeitar a Administração Pública, não configura o crime.
Não se pode admitir que em impropérios proferidos contra funcionário público, que executa ato ilegal, não exista um sentimento de repulsa, uma mera resistência passiva, algo que é inerente à própria natureza humana.
Dentro dessa tônica, para a configuração do delito de desacato, o desprezo ou a humilhação ao servidor público deve integrar a conduta descrita, não incidindo a sanção para os casos de mero desabafo, censura ou queixa, que não têm o objetivo finalístico previsto no tipo.
É necessário que o sujeito tenha agido com a vontade livre e consciente de desprestigiar a função pública exercida pelo ofendido.
Os cidadãos têm o direito de criticar e examinar as ações e atitudes dos funcionários públicos no exercício de suas funções.
O ofício da função pública não se coaduna com melindres ou suscetibilidades por parte do agente estatal.
Nesse contexto, o agente público não deve ter a seu dispor o recurso ao arbítrio, mediante a utilização de um tipo penal, que possibilita largamente o autoritarismo com a indevida repressão às críticas à Administração Pública, à sua própria atuação, tolhendo e restringindo o direito fundamental das pessoas à livre manifestação de pensamento e, em consequência, violentando o cerne da democracia.
É bem verdade, que as leis de desacato proporcionam um maior nível de proteção aos funcionários públicos do que os cidadãos privados, em direta contravenção com o princípio fundamental de um sistema democrático, que sujeita o governo a controle popular para impedir e controlar o abuso de seus poderes coercitivos.
Os funcionários públicos estão sujeitos a maior escrutínio da sociedade.
Punir o cidadão por expressar sua opinião contra os agentes estatais fere de morte a liberdade de expressão e o direito à informação.
A Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) no julgamento do REsp 1.640.084, descriminalizou a conduta tipificada como crime de desacato a autoridade, por entender que a tipificação é incompatível com o artigo 13 da Convenção Americana de Direitos Humanos (Pacto de São José da Costa Rica).
Segundo o ministro relator do recurso no STJ, Ribeiro Dantas, “A criminalização do desacato está na contramão do humanismo, porque ressalta a preponderância do Estado – personificado em seus agentes – sobre o indivíduo”.
Por fim, ressalta o magistrado que a descriminalização da conduta não significa liberdade para as agressões verbais ilimitadas, já que o agente pode ser responsabilizado de outras formais pela agressão.
O que foi alterado é a impossibilidade de condenar alguém, em âmbito de ação penal, por desacato a autoridade.
*Advogado Especialista em Direito Constitucional e Direito Eleitoral