Aqueles que acham que o período militar foi bom – ou que não houve morte nem tortura – não surgiram do nada; eles apenas sentiram-se agora encorajados por Bolsonaro a botar para fora toda carga de emoção reprimida por 55 anos
Editorial
De uma hora para outra, passou-se a ler nas redes sociais, em blogs e em grupos de troca de mensagens, as mais diversas defesas do período da ditadura militar no Brasil.
É gente que questiona o número de mortos, que ignora as torturas e até aqueles que afirmam, peremptoriamente: “a Ditadura nunca existiu!”
Mas o culto à ditadura não se trata de nenhuma catarse coletiva.
Não é que milhares, talvez milhões de pessoas passaram a fazer um revisionismo histórico para mudar a versão daquilo que, de fato, existiu.
Na verdade, essas pessoas sempre estiveram por aí.
Ao longo desses 55 anos de história, brasileiros de todas as tendências, gênero, raça, credo ou posição social, viviam numa espécie de limbo: acreditavam mesmo que a ditadura era uma invenção, mas calavam-se diante da vergonha que era defender atrocidades como a cometida contra o jornalista Wladimir Herzog.
Agora eles estão livres para gritar, estimulados por um presidente, que também foi militar durante a ditadura e que se acostumou a defender torturadores publicamente e fazer apologia das mortes do regime militar.
Com Jair Bolsonaro (PCdoB), essa horda de pessoas saiu das sombras para gritar, espernear e justificar os assassinatos, negar as torturas e apresentar novas versões para o golpe de 64.
Os argumentos são sempre os mesmos: “ah, meu avô disse que nunca teve problemas com os militares”; ou então “rapaz, ‘na revolução’, só quem apanhava dos militares eram os baderneiros, vagabundos”.
São discursos comuns de famílias tradicionais – pobres, ricas; pretas ou brancas – que seguiam a ordem unida determinada, baixavam a cabeça para o regime e colaboravam para evitar problemas.
É claro que esses sempre vão dizer que nada sofreram na ditadura. Nem tinham porque, colaboracionistas que eram.
Mas eles sempre estiveram aí, retraídos, sufocados, angustiados por não poder gritar o que pensavam, como camaleões a se adaptar a cada momento do Brasil, baixando a cabeça, aceitando, como fizeram durante a ditadura.
Agora gritam – como os evangélicos gritam, como os conservadores gritam, como os militares gritam – a plenos pulmões.
E até farão festas no próximo domingo, 31, em nome dos que mataram centenas.
É o momento deles no Brasil…
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