Por Carlos Sérgio de Carvalho Barros*
Poucos momentos na história republicana brasileira mostram-se tão emblemáticos quanto os ora vividos. A representatividade popular encontra-se vulnerada e a legitimidade dos eleitos, talvez, nunca tenha sido tão questionada. Governantes desgastados, os eleitos distanciados dos eleitores, escândalos, corrupção em diversos níveis, influentes lideranças partidárias presas ou ameaçadas de prisão, quase todos os políticos respondendo a diversas ações judiciais, enfim, a política quase toda criminalizada – são algumas das facetas desta grave crise.
Todos os que se aventuram na atividade político-partidária, notadamente os candidatos, não estão imunes à crise. A política se tornou uma atividade de alto risco. Exige-se muito dos candidatos aos cargos municipais: que conheçam os problemas locais, que tenham trânsito com os governos, que saibam comunicar-se, que atendam aos eleitores em tudo que precisarem, sempre com simpatia e gentileza, e que ainda estejam dispostos a comprometer o seu patrimônio pessoal, profissional e financeiro nesta difícil e incerta empreitada. E isso tudo para o exercício, se vitorioso, de um mandato temporário, com riscos permanentes de seu encurtamento, sendo que das suas ações, omissões, opções ou mesmo nada disso, resultarão em processos que perdurarão por muitos anos. Afinal, diz-se que se é prefeito por quatro anos e ex-prefeito pelo resto da vida! Quem se atreve?
Depois de eleito, a responsabilidade só se multiplica: implementar políticas públicas que atendam à uma sociedade heterogênea, potencializar os parcos recursos, lidar com corporativismos dos mais variados, ser eficiente e econômico, prezar sempre pela probidade, não desviar e jamais permitir desvios ou favorecimentos indevidos, ter capacidade de comando e saber escolher aqueles com quem dividirá a gestão são alguns dos atributos indispensáveis, embora insuficientes. E, muitas vezes, nem se sabe se está fazendo isso correto ou não!
E ainda se exige mais: que o eleito disponha de personalidade apta a lidar com as mais ferrenhas críticas, cobranças e acusações, com os mais variados questionamentos, julgamentos antecipados, preconceitos e as constantes ameaças de processos, afastamentos e prisões; não se sabendo, muitas vezes, nem o porquê da suspeita, da investigação, do processo e de outras ações dos órgãos acusadores, em sua maioria sigilosas, e sem que o advogado tenha sequer acesso ao seu inteiro teor ou possa rebater na mesma proporção.
Enfim, a atividade política-eleitoral, talvez mais do que nunca, está a exigir grandes sacrifícios daqueles que almejam um cargo público. E diante dessas dificuldades, dentre outras necessidades, o conhecimento das normas que regulamentam as eleições se torna imprescindível para uma boa campanha, evitando deslizes que podem implicar em impugnações, processos, multas e até mesmo em cassação do mandato. A preocupação com a arrecadação e os gastos das campanhas está no centro das normas que regulamentam as Eleições 2016, como que buscando inibir o que seria o germe propulsor da corrupção no país. Mas, obliquamente, ao tempo em que se estabelecem regras e mais rígidas, robustece-se a preponderância do Judiciário e do Ministério Público no processo eleitoral e na política de forma geral.
Por mais emblemática que seja a conjuntura atual, não existe saída adequada fora do regime democrático. Por mais questionados que estejam nossos representantes, o voto popular, direto, universal e secreto continua sendo a ferramenta mais legítima de outorga de poder. O povo é o titular do poder, que o exerce através de seus representantes, com duração de mandatos previamente definidos e competências repartidas, sempre com a opção de destituí-los ou não. Devemos aprimorar os mecanismos de depuração dos candidatos e de responsabilização dos eleitos, mas não podemos criar tantos obstáculos que afastem os bons da política, como – ao contrário do que se esperava – parece estar ocorrendo.
Melhor do que qualquer ditadura é a alternância de poder; melhor do que os burocratas é o exercício do governo por aqueles escolhidos pela população. Isto é uma conquista da nossa civilização e não podemos retroceder. E devemos conhecer o direito eleitoral para que o processo de escolha dos nossos representantes ocorra sempre com respeito às regras, com igualdade de oportunidades, transparência e lisura.
E, para não macular a legitimidade dos pleitos eleitorais, devemos exercitar os mecanismos de combate aos abusos políticos e econômicos e às condutas irregulares.
*Advogado especialista em Direito Eleitoral
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